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27.12.04

Meias palavras, ações completas

"T pod deix tu orig, ma a orig nun pod deix a t"

(Didier Laframboise)

Não é recente a idéia de que meias palavras bastam aos bons entendedores. No entanto, foram poucos os homens que levaram a concepção às últimas consequências.

Um deles é o literato e monarquista franco-polinésio Didier Laframboise (1793-186?), pioneiro ao levar o "mei pala ba" a todos os cantos do arquipélago localizado no meio do Oceano Pacífico.

Depois de sair de Marselha se dizendo-se um dos representantes legítimos de Atua Fafine, o Deus criador polinésio, e percorrer os umbrais de toda a Europa, Laframboise aventurou-se a desbravar a Oceania. O Novíssimo Mundo se apresentava.

O auto-proclamado representante de Fafine o fez logo após a ascensão de Carlos X ao trono, com a restauração da dinastia dos Bourbon e a queda dos simpatizantes de Napoleão do poder. A monarquia francesa rapidamente se encantou com a fleuma arrebatadora que vinha do jovem poeta e redator dos editais do novo governo, o qual defendia com ardor. Desbravador. Magnânimo. Original, embora nem sempre compreensível.

Laframboise, naquele mesmo ano, viu-se no topo do mundo. Ou ao menos perto dele. Seu melhor amigo, o ultranacionalista Jules Armand de Polignac, foi indicado a ministro chefe do Rei. A Grande França que os monarquistas sonhavam estava perto. Faltava o além-mar.

E foi aí que Laframboise viu sua nova chance de se aproximar do poder. Mas não de forma torpe. Ele queria influência, onde quer que fosse. Por isso, escolheu desbravar o Novíssimo Continente. Sabia que a tarefa só podia ser sua.

Assim foi. Financiado pela Coroa, Laframboise navegou 143 dias em uma barcaça de nome "Le Watterloo" e desembarcou em Ua Huka, ao noroeste do Taiti. Logo contou com a admiração dos locais, que o reverenciaram por compreenderem parcialmente o que ele dizia com suas meias palavras, semelhantes ao idioma da região. Sentiam-no como um guia, enviado pelos mares. Rapidamente se fez popular.

Sorte não parava por aí: Laframboise chegou ao destino em 9 de outubro de 1829, dia do aniversário do monarca. O rei demonstrou gran regozijar com a notícia, dois meses depois, quando a ouviu do mensageiro que trouxe "Le Watterloo" de volta. Quase pediu um decreto para homenagear o desbravador, mas o redator estava de folga, o que inviabilizou a empreitada.

Não se pode interceder, no entanto, pelo fato de que isso tenha mudado o destino de Laframboise na Polinésia. O combinado era um retorno em dois anos. A falta de coordenadas da região, no entanto, impediu o resgate do brilhante homem e de sua tripulação. Homens que não mais quiseram ser resgatados. Sabiam que tinham um papel histórico para com aquela gente simples, meio tosca talvez.

Ouviam o guru poeta, que respondia sempre: "Ten temp e ten pacie. On nã exis alm, dev exis u ling e u estim a am!", escreveu ele na primeira de suas obras, chamada "Diar d Ua Huka, a Jorn Se Retor". Com a persistência de Laframboise, o livro se tornou obra de referência para os habitantes da ilha, que também passaram a conhecer o papel, as escolhas e mesmo o próprio conceito de livro.

O esforço libertador por meio do conhecimento era o início de uma jornada desconhecida que mostrasse àquelas pessoas a noção de tradição moral sem corromper a originalidade libertária da qual eram dotados. (Continua)

2 Comments:

Blogger Roberto Iza Valdés said...

Este comentário foi removido por um administrador do blog.

4 de novembro de 2005 às 09:56  
Blogger Unknown said...

Este comentário foi removido pelo autor.

31 de agosto de 2007 às 10:49  

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